quando vc me convidou pra desbravar o centro de são paulo à noite eu não tive coragem..
dessa vez não teve jeito.. era o único caminho plausível.
(pq eu que não iria pegar um ônibus pra ir do p´tio do colégio até a rua augusta)

naquele dia vc até insistiu.. mas eu tive medo.
medo besta, inexplicável, como quase todos..
mas tinha a câmera na mochila também.
(de fato, um bom motivo pro meu "pânico adolescente")

mas dessa vez não. não tive medo!
lembrei de todas as cartilhas feministas que passaram pelas minhas mãos ao longo da vida..
repassei, uma a uma, todas as dicas sobre não ser uma vítima no meio do caos urbano..
andar com os braços soltos, olhar as pessoas nos olhos, levar algo na mão que sirva como arma.. e a parte que mais me incomoda: se dessexualizar..

foi então que percebi.
meu lado menina é que sente medo!
prender o cabelo, colocar uma touca e um casaco largo, andar sem rebolar!
atitudes simples (?) que me transmitem segurança.

meu lado menina sente medo.
e esse medo não é bobo, não é fútil e, pior, tem fundamento!
que saco!

em meio aos boulervards escuros do centro, cada ser avistado, uma surpresa.
cada surpresa, a necessidade de um comportamento diferente..
olhares ameaçadores, olhares de orgulho, de curiosidade, de compaixão..
ali eu pude sentir mais uma das faces que o machismo usa pra se apresentar no cotidiano..
somos todas vítimas. nem sempre voluveis.
nem sempre conscientes. mas sempre incompreendidas..
pq eles nem sempre são vilões. mas tb quase nunca têm a ampla consciência necessária sobre o potencial ameaçador..


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foi inevitável não lembrar de vc.
e da segurança que sentia ao teu lado.

mais um motivo pra questionar o que, de fato, me deixa segura.