a morte.
a morte só serve pra nos trazer experiência de vida.
a dos outros, claro.
a nossa não traz nada.
..
ontem foi um dia de muitas mortes, acho.
o memorial estava lotado!
muitos carros..
muitas pessoas, todas bem arrumadas!
a morte é uma ocasião especial.
talvez só eu não tivesse me dado conta disso.
dentro do meu habitual jeans&camiseta&papete, me senti mal vestida naquela cumprimentação toda de familiares.
(mas ok, eu sempre fui o lado mal vestido da família mesmo)
além do que, gafe maior mesmo foi perguntar "tudo bem?" ao encontrar a filha da falecida..
acontece. é o hábito!
...
minha família é italiana.
aquela coisa faladeira.. muita gente!
tutti primos... hehe
e só se encontra em velório.
tem os pequenos núcleos, claro.
mas é só em velório que um núcleo encontra outro.
daí é um tal de querer botar a fofoca em dia e trocar telefone ali mesmo, do lado do caixão.
mas ontem isso tudo teve um quê de especial.
que eu só senti ao me deparar com aquele corpo coberto de rosas...
outra gafe!
confundi as tias. não recordava exatamente quem era a nira. assim por nome.
mas foi só avistar o caixão e mil recordações vieram à cabeça.
a nira era especial..
tinha pouco contato com ela, é verdade.
mas gostava muito de todas as vezes que a encontrava.
a família dizia que ela não tinha "papas" na língua.
de fato, não tinha.
falava o que pensava. ria sempre!
falava o que fazia pensar também, sempre com muito humor!
..
em alguns momentos, ali no meu cantinho, observando aquele cenário florido que permeia a morte, devo confessar que cheguei a imaginar a nira levantando do caixão, reclamando daquele monte de flores e rindo da cara de todo mundo. seria a cara dela uma piada assim!
mas não foi piada!
ela se foi mesmo.
e com ela, boa parte das piadas das reuniões familiares.
talvez boa parte das próprias reuniões familiares tenham ido junto também..
....
hoje a morte me pegou de novo!
dessa vez num núcleo familiar mais próximo de mim.
bem próximo.
"a orelha dormiu e não acordou mais"
foi assim que meu pai me contou...
inexplicavelmente, chorei de forma compulsiva.
talvez por culpa..
a orelha foi a cachorra mais chata que já conheci..
carente demais, irritante, mal educada, fedida..
não sei se é inadequado eu tentar justificar que gostava dela mesmo assim.
...
o fato é que a morte quase sempre nos pega de surpresa.
sempre achamos que teremos mais tempo.
apenas egoísmo.
a morte pra quem sofre deve ser um alívio.
pra quem fica é que é sofrimento..
no meu enterro eu quero uma festa. acho!
sem rezas, por favor! que sou capaz de levantar do caixão e dar pitti!
sem pompa também.. podem ir com a roupa que estiverem em casa. não ligo.
e aproveitem pra pegar telefones dos mais distantes..
assim a ocasião toda acaba servindo pra alguma coisa..
...
a morte tem cheiro de flor.